terça-feira, 27 de outubro de 2009

GERAÇÃO CONFUNDIDA?



De vez em quando, sou ouvinte na Antena 3 do programa conduzido por Fernando Alvim, “Prova Oral”. Este espaço radiofónico dos finais de tarde, conta com convidados que se distinguem em áreas diversas, para participarem em discussões distendidas sobre temáticas vocacionadas para um público jovem, havendo sempre lugar para a participação dos ouvintes. Geralmente, são abordagens vivas e curiosas sobre os interesses/preocupações de jovens adultos.
Há algumas semanas atrás, segui atentamente a conversa com um técnico espanhol que com frequência nos visita para participar em diferentes estudos da área sociológica, iniciativas conjuntas de instituições de ambos países. Na ocasião, o tema em análise era o desemprego avassalador e a necessidade de encontrar saídas.
Depois de reflectir sobre a realidade portuguesa e espanhola, em especial da faixa etária dos 20/30, recém-especializados à procura do primeiro emprego ou com fugaz experiencia de trabalho, não foi preciso esperar muito pela presença de vários participantes em situação similar. O que nos contavam: “cursos terminados há pouco tempo; uma ou outra experiência de trabalho precário; impossibilidade de vislumbrar qualquer oportunidade na área da sua formação; ausência de qualquer apoio dos organismos governamentais além do mísero subsídio para alguns; possibilidade de continuar a contar com o apoio da família.” Depois de ouvir a sucessiva repetição de idênticos exemplos, o especialista em causa, fez algumas perguntas e os presentes foram respondendo: Quem eram, onde se encontravam naquele momento e a fazer o quê? “Um grupo de amigos, com vinte e tais e à procura de trabalho, reunidos na casa de um deles como todas as tardes, a jogar e a ouvir musica…” Directo ao assunto, começou por dizer: Na vossa idade, ninguém se deve preocupar com o vosso futuro senão vós. Dignos de pena (à espanhola) são aqueles que depois dos cinquenta anos perdem o emprego. Vós não. Aquilo que sempre repito a gente da vossa idade é, ânimo! Não ficar à espera. Saiam de casa, todos os dias pelas 7 da manhã, procurem e regressem pelas 10 da noite. Se fizerem assim, verão como a situação muda. Por fim, disse: Volto cá daqui a três meses. Caso queiram, voltarei ao programa para me dizerem se não estão já a trabalhar. Aquela meia dúzia de jovens que iniciaram o diálogo bem dispostos e felizes na aparência, emudecidos terminaram. O Fernando Alvim meio perplexo. E eu, do lado de cá, confesso que também. Porquê? Talvez por fazer parte daqueles que se habituaram a condescender em demasia.
A propósito de que vem isto? Daquilo que já nem surpreende. Há dias foram postos à venda bilhetes para o tão esperado concerto dos U2, em Out. do próximo ano. Nos locais de venda previstos, o que presenciamos? Dos mesmos jovens, acampando e desafiando a intempérie com dias de antecedência. Sacrificando-se? Provavelmente. Mas alegres como quem já antecipa a festa. Dias depois é anunciado novo espectáculo. Nova romaria dos mais recônditos cantos do país. Os mesmos sacrifícios mas a mesma felicidade. Com o objectivo ultimo de concretizar um sonho. Sonhos?!

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

CAVACO – SÓCRATES
POR UMA BOA RETALIAÇÃO


Antes de tudo, sobre as vigilâncias ou escutas, poderá existir muita coisa desconhecida. Até agora, não há razões para confirmar o que seja. Então, nada mais a dizer sobre este enredo tosco e manhoso, seja quem for responsável.
O que é relevante e há muito existe é um péssimo clima político que da fricção passou à confrontação entre Belém e S. Bento. São consequências das duas faces de Sócrates e Cavaco, personagens políticas com duas peles que persistem em cultivar uma imagem que não os dignifica. E nesta altura já não há inocentes.
A comunicação do Presidente e a resposta socialista devem merecer atenção. Cavaco desceu do plano institucional ao plano pessoal, e denunciou uma manobra de condicionamento urdida pelo partido do governo para o ligar a interesses do PSD. O PS procurou devolver a acusação com um contra-ataque fundado na inexistência de qualquer prova sobre vigilância da Presidência. Surpreendente foi o tom acutilante da comunicação de Cavaco e o alinhamento dos socialistas por idêntico discurso. Estes, acabaram por desperdiçar a oportunidade de se colocarem em nível superior, se tivessem respondido noutro registo. Intervenções lamentáveis.
Da parte do PS ou do governo, os últimos tempos têm sido de quezília, senão de afronta, com Belém. Apesar disso, no que se refere ao caso das escutas, mantém toda a legitimidade para afirmar que a trama não passa de uma invenção.
Da parte do PSD, com o consulado de Ferreira Leite ressuscitou o fantasma do cavaquismo e a incapacidade de o afastar definitivamente. Mais não fosse, para evitar acusações do favorecimento presidencial que, na verdade, nunca se verificou. Assim, legitimamente, reclamaram pelo facto de Cavaco não ter falado antes das eleições. Mesmo sendo óbvio que nas circunstâncias actuais, o silêncio ou a palavra, o que fosse e quando fosse, prejudicaria sempre os interesses social-democratas.
O que de essencial resulta deste conflito em crescendo? Se até agora só havia atrito, subitamente o país é surpreendido com uma assumida hostilidade. Representa o regresso do Cavaco conflituoso e do Sócrates confrontador. O menos aconselhável num momento crítico como o presente.
Cavaco agiria de igual forma se o desfecho eleitoral fosse diferente? Seria um contra-senso, tanto se o PSD fosse o vencedor como se o PS tivesse a maioria absoluta. Falaria apenas sobre as questões de segurança, vagamente, com a serenidade com que sabe estar, não atacando quem quer que fosse. Falar antes da jornada eleitoral é que nunca aconteceria. Atento ao que considerou manobra socialista, não ofereceria a Sócrates o excelente motivo para a derradeira dramatização.
Então, o que pretende Cavaco? Sem entrar por elaboradas conjecturas, poderá ser uma estranha “retaliação institucional”. O reflexo da sempre lembrada quebra de compromissos protagonizada por Sócrates. Objectivo: recolocá-lo onde estava, no começo da legislatura. Isto é: recuperar a cooperação institucional.
Hoje, concordaremos que é Sócrates quem mais precisa dessa paz. A propósito, Vilaverde-Cabral referia: “O que se antevê é uma difícil convivência institucional. Algo que é mais difícil para Cavaco. Sócrates não tem a mesma estatura política.”