sexta-feira, 31 de maio de 2013

"Fenómeno Mourinho"



FIM DA PASSAGEM DO PORTUGUÊS POR MADRID

Este fim-de-semana chega ao fim a tarefa do melhor treinador da actualidade no complicado mundo do futebol espanhol. E como a experiência tem provado, a vida de treinador estrangeiro em Espanha não é fácil. Bem pior, se for um português no comando técnico do principal clube da capital espanhola.

Entre muitas das tradições madridistas sustentadas por um histórico de títulos invulgar, o Real Madrid é também o clube do mais exacerbado e controverso centralismo nacionalista, onde os profissionais estrangeiros com algumas afinidades com Espanha têm vida mais difícil: se forem jogadores, apenas são tolerados enquanto forem excepcionais, como é o caso de C. Ronaldo; se forem treinadores, dificilmente são reconhecidos, a não ser os originários de países que considerem superiores, como no caso de holandeses ou italianos. Com tal presunção, são implacáveis com os melhores jogadores e técnicos argentinos ou portugueses. Por essa excessiva defesa da sua gente, chegam a presumir ter grandes estrelas a jogar e a treinar nas principais ligas de futebol, como a inglesa.

Para quem conheça e tenha acompanhado o percurso de José Mourinho como treinador de excepção, teve oportunidade de verificar os principais traços da sua personalidade, sobretudo naquilo que caracteriza a postura profissional. Não seremos excessivos se considerarmos Mourinho um homem que mistura com todas as qualidades humanas e profissionais, quanto baste de arrogância ou prepotência que todos os bem sucedidos no ofício da condução de futebolistas jamais poderão dispensar. Também não será descabido referir o imenso egocentrismo do José, capaz de descuidar a super protecção que muita irresponsabilidade de alguns dos seus jogadores exigiria. Quanto à arrogância, o próprio se tem encarregado de ser peremptório: todos os grandes líderes são arrogantes (pelo menos, no caso do pontapé na bola, concordaremos). Quanto ao carácter egocêntrico, quem não reconhecer algo de fundamental que está associado ao dito culto da personalidade está ser tendencioso. Referimo-nos aos méritos na arte da comunicação, que tão bem domina e tão útil é à indústria futebolística. Só que as maldades dos media não se ficaram por aqui.        

Em relação à ancestral animosidade dos espanhóis para com os portugueses, quando Mourinho chegou a Espanha já tinha toda a imprensa castelhana munida de desconfiança e preparada para o atingir por todos os flancos. Apesar do seu curriculum e do reconhecimento universal de que beneficiava seria visado sem contemplações na primeira ocasião. E essa campanha iniciou depressa a caminhada, para delícia do José e em prejuízo dos nativos. Com as insinuações e suspeições mais desestabilizadoras, com as informações e manipulações mais deturpadoras, os mais conhecidos e influentes jornalistas foram verbalizando continuadamente a sua hostilidade contra o português. O mais estranho desta travessia de três anos, sempre foi a facilidade com que um homem só, exímio na gestão do espaço mediático que lhe pudesse corresponder, tudo conduziu como quis, contra um colectivo de profissionais da comunicação que invariavelmente, nem conseguiram ultrapassar um sectarismo do mais primário.

As principais bandeiras dos inimigos de Mourinho foram acusações pueris do tipo: não se permite que um treinador falte ao respeito aos jogadores - deviam dizer, a duas ou três“vacas sagradas” que jogam na selecção; não se aceita que um treinador se sobreponha à mística de um clube como o Real Madrid - queriam dizer, a sua obrigação era dar exemplo dos valores da casa. Só disparates de despeitados. Enquanto isso, contra Mou, qualquer birra ou traição dos espanhóis da selecção era tolerada pela subserviente imprensa de Madrid; se fossem portugueses como Pepe ou Coentrão, tanto melhor por serem do seu país; quem prejudicava o clube era um treinador que tinha acabado com um balneário habituado à auto-gestão. Se nada mais houvesse para dizer, carecia de desportivismo. Desde sempre, os adeptos acusaram a imprensa de perseguição ao técnico enquanto se mantinham incondicionais do treinador, até que a saída de Mou se confirmasse. A comunicação social acabava a sua cruzada reconhecendo que deixou enormes saudades nos jogadores do Chelsea e do Inter, quando abandonou esses clubes, sem se interrogarem porque seria tão diferente com os do Real Madrid. 

Mourinho regressa ao ponto de partida. Certamente para recomeçar novo ciclo. Em Espanha ficaram os seus principais inimigos absorvidos por uma última irritação: os jornalistas verificaram que ninguém ganhou a guerra contra Mourinho. Como simbólico estertor convidaram o presidente do Real Madrid para uma entrevista de balanço. Objectivo: questionar Florentino Pérez sobre o fracasso do treinador português. Como grande senhor que sempre foi, esteve irrepreensível no reconhecimento do trabalho realizado, agradeceu ao treinador José o que fez pelo seu clube, desejou-lhe sucesso na continuação da carreira, tudo sem qualquer acusação a Mourinho.          

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