quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Europa dos vícios



ESTAMOS SOZINHOS

Não há conversa pública ou privada que não chegue à mesma conclusão: quer queira, quer não queira, a Europa tem de nos salvar. Mas como? Financiando generosamente, e por interesse próprio, o desastre em que nos metemos. Por outras palavras, pagando a dívida, ou boa parte dela, reduzindo as taxas de juro e, talvez por caridade, investindo na nossa desgraçada economia. O pessoal político (incluindo os comentadores) percebe que essa nossa putativa benfeitora não anda bem, para não dizer que anda muito mal. Mas não percebe porquê. Para uns, porque Delors e Kohl foram substituídos por gente menor; para os socialistas, porque a direita manda; e para o cidadão pouco informado por causa da infinita maldade da sra. Merkel e da fraqueza do sr. Hollande.
Mas ninguém se pergunta se a Europa pode de facto ser "solidária" (para usar a expressão comum). O que não deixa de ser curioso, porque, entregue a si própria, ela nunca o foi. O famoso século de paz, que precedeu a I Guerra, não se distinguiu pela sua cordura e, no fim, era um impossível novelo de suspeitas, de manobras, de ambição e de conflito, que em 1914 ninguém conseguiu impedir que explodisse. Pior ainda, só a intervenção da América impediu que a matança continuasse indefinidamente ou se resolvesse por exaustão ou simples miséria. Sucede que a América (o Congresso americano) se recusou a tutelar a Europa arrasada e ressentida de 1918 e voltou ao isolacionismo. É sabido o que sucedeu depois: do império hitleriano ao império de Estaline, o horror prevaleceu durante 40 anos.
No extremo ocidental, a América e a Inglaterra, com exércitos de ocupação, impuseram uma certa ordem e algum crescimento e a Europa até se julgou curada da sua velha história e um cúmulo de virtudes que o mundo devia imitar e venerar. Infelizmente, o colapso da URSS (e do comunismo em geral) desinteressou a América da Europa e esta Europa de hoje recaiu na competição e na mesquinhez do passado, sob a sombra da Alemanha que redescobriu sem vergonha ou remorso as suas pretensões de hegemonia. A moral é clara: sem a influência (e o domínio) de uma potência que a ponha na ordem, a Europa reverte aos seus vícios. A "solidariedade" (linda palavra) não existe e menos para nós que não pesamos nas conversas dos "grandes" com os seus vassalos. Estamos sozinhos e sairemos, ou não sairemos, sem qualquer ajuda.

Vasco Pulido Valente - Público

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