terça-feira, 2 de julho de 2013

Não-efeitos das greves gerais



A GREVE GERAL

Escrevo no próprio dia da greve, esta coluna que só depois vai ser lida. De qualquer maneira, arrisco uma previsão: mesmo correndo o melhor possível para a CGTP e a UGT, a greve não irá mudar nada: nem a permanência ou as políticas do Governo, nem a atmosfera da vida pública portuguesa, excepto se provocar uma explosão de violência em Portugal inteiro (caso pouco provável, pelo menos para a polícia). Por que razão, ou razões, não acredito na eficácia deste protesto, teoricamente ameaçador e forte? Em primeiro lugar, porque nenhuma greve geral na velha Europa como na Europa de Bruxelas jamais conseguiu mudar fosse o que fosse, até no tempo em que a militância ideológica e partidária era muito mais corrosiva e extensa. De resto, Passos Coelho já suportou três greves gerais, com incómodo, com certeza, mas tranquilamente.
A segunda razão é a de que a greve, por natureza dispersa, talvez junte algumas dezenas de milhares de pessoas no centro de Lisboa e do Porto, mas não juntará mais de umas centenas no resto do país. Desde 2011 que o português vulgar se habituou a este espectáculo e não parece que se comova especialmente agora: os precedentes não encorajam a pensar que de repente as grandes manifestações tenham as consequências que até hoje não tiveram. Depois, os trabalhadores de empresas privadas não querem contribuir para lhes criar dificuldades, que põem em perigo o seu próprio emprego; e uma parte talvez considerável de funcionários públicos, que o Governo maltratou e espremeu, não tenciona dispensar outro dia de salário, sem utilidade garantida.
Ao contrário da greve geral, com a sua ressonância dramática, as greves que levam a efeitos práticos são sempre as de trabalhadores do Estado, que dominam e conseguem rapidamente paralisar sectores fundamentais da economia ou da sociedade: transportes, medicina, ensino e por aí fora. Como toda a gente sabe, Nuno Crato acabou por se render, assegurando à Fenprof (e ao Partido Comunista) a sua velha ditadura sobre a "educação". Uma campanha hipócrita e piegas sobre as criancinhas, que, segundo consta, sofrem uma insuportável ansiedade se um exame é avançado ou adiado, bastou para dobrar o Governo e lhe raspar toda a sua arrogância. Os paizinhos, claro, pretendiam principalmente que não lhes perturbassem os planos de férias. Esta foi uma greve inteligente, conduzida com inteligência e com um fim favorável aos grevistas. A greve geral não passa de uma homenagem obsoleta a uma tradição morta.

Vasco Pulido Valente - Público

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