quinta-feira, 4 de julho de 2013

Quem não tem rouba (?)


OS GÉNIOS QUE NOS GUIAM

Não tenho uma palavra a tirar do que escrevi na manhã do dia da greve geral. A greve foi, para variar, uma greve de trabalhadores do Estado, muito especialmente dos transportes, que pouco a pouco se tornaram uma espécie de representantes do país. A interpretação que se deu depois ao que sucedera é que me espantou. Um sábio comentarista declarou o "protesto" uma forma democrática e pacífica de "canalizar" o descontentamento, mas não pareceu perceber que esse "protesto", minuciosamente organizado, foi um melancólico fracasso. Outro sábio comentador disse que o lúgubre espectáculo de quinta-feira ajudara a salvar a pátria e também a alma do lusíada, coitado. E ainda outro (um ministro) declarou com solenidade que respeitava os grevistas, como se os grevistas precisassem para alguma coisa do respeito dele.
Como de costume a CGTP proclamou a chamada "paralisação" nada menos do que "extraordinária". Não viu com certeza as ruas vazias, nem as praias cheias. Nunca a realidade consegue penetrar na colectiva cabeça de um verdadeiro comunista. A UGT, com o embaraço de quem evita mentir muito, anunciou um grau de adesão de 50 por cento, segundo o velho princípio português de não ofender ou irritar ninguém. Mas, no fim da festa, Carlos Silva aliviou o seu sobrecarregado espírito com duas máximas definitivas. Começou por explicar que a greve geral estava a ser "banalizada", como se ele próprio não tivesse a menor responsabilidade por essa "banalização". E, a seguir, ofereceu ao "bom povo" de Portugal este infalível método de governo: "Primeiro o combate à fome, à miséria, à desigualdade. Primeiro nós", claro. E as "contas" que esperem.
Não sei se este sistema é alegremente aceite nas lojas em que o sr. Carlos Silva se abastece. De qualquer maneira, distrai da ladainha estabelecida: a política falhada do sr. Gaspar, a necessidade de correr com Passos Coelho, a fantasia do "crescimento económico" e a urgência de uma baixa perceptível de impostos. Para não falar na miséria dos portugueses, que deviam prender, julgar e condenar os respeitáveis malandros que nos meteram neste sarilho. O sr. Carlos Silva da UGT, ao menos, conseguiu propor uma solução expeditiva e simples. Nós, por gentileza, agradecemos. Carlos Silva chegou finalmente ao nó do problema: quem não tem rouba. É finalmente o ovo de Colombo.

Vasco Pulido Valente - Público

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