sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Corrupção instituida



Nos períodos de dificuldades financeiras, surgem renovadas preocupações com a corrupção, sobretudo nos países mais afectados pelas crises. No último relatório internacional do final do ano, sobre a percepção da corrupção mundial, Portugal e Espanha repetem habitual presença entre os últimos países da zona euro. Esta classificação tão pouco abonatória dos países ibéricos, coincide também com particulares movimentações pela transparência que agitam os dois países, mas com significativas diferenças na forma de combate adoptada.   

Em Espanha, não há comunidade autónoma onde não decorram acções judiciais contra numerosos acusados de corrupção. Políticos nacionais e de província; governantes regionais e municipais; empresários e profissionais de todos os ramos; artistas de dotes vários no desporto ou no espectáculo; familiares ou amigos e protegidos pelo poder; figurantes da realeza soberana e terratenente; de tudo sem escapar classe impoluta. Há centenas de envolvidos e detidos em quantidade, de todas as regiões e castas políticas. Com várias línguas e tradições, da Catalunha à Andaluzia, medraram na abundância e com todos os meios, as melhores condições para a expansão dos corruptos. Agora, é a influente e agressiva imprensa que se dedica à desmontagem da teia de interesses que contaminou todos os sectores apetecíveis. Louvável o trabalho de investigação e denúncia desenvolvido pelos principais jornais da capital espanhola. 

Em Portugal, ninguém se dedica à coisa com entusiasmo ou dedicação. Ou por estarem convencidos ser tarefa condenada ao fracasso, ou por recusarem perder as suas oportunidades de beneficiar, ou simplesmente por ser uma maçada. Só se repetem acusações do tipo: são todos uns corruptos ...os outros. Depois não falta quem se admire de vivermos no manhoso sítio da impunidade, com tantos dispostos a pactuar com corruptos. Veja-se o que decorre da promiscuidade entre os negócios e a política: um desrespeito absoluto pelo Estado de direito, com violação de leis e desobediência aos tribunais, nas poucas irregularidades detectadas. Com exemplos destes, é possível convencer o cidadão incrédulo da eficácia da luta contra a fraude e do interesse do poder no combate da corrupção? É melhor perder a esperança de alguma vez ver punido qualquer corrupto que pudesse servir de exemplo. Apesar de tão perto e tantas coisas em comum, como  estamos distantes de Espanha no combate destes crimes. 

A corrupção que se estabeleceu e enraizou em países como Portugal, com um modelo de Estado interventor e protector, pesado no funcionalismo e na burocracia, jamais será combatida com eficácia pela máquina estatal onde se desenvolve a calamidade. Não se esqueça da forma como a política se financia e como tantos organismos dependem em exclusivo do Estado. Apesar de sempre se remeter para o Estado a obrigação de fiscalizar casos de fraude em todos os domínios onde interfere, os agentes dessa fiscalização são os que dão vida ao principal organismo corrupto. Todos à espera de um absurdo: do êxito no combate à corrupção patrocinado por corruptos. Uma velha e fracassada tese que acções de tantos países contrariam. Exemplos: os tradicionais casos de muita transparência e pouca fraude dos países nórdicos estão associados a práticas cívicas de raiz cultural; a Nova Zelândia é outra experiência de boa organização territorial prestigiada pela transparência; o Estado asiático melhor cotado é Singapura com uma economia dirigida pelo mercado; nos países sulamericanos o melhor exemplo é o Chile onde o Estado nem apoia nem dificulta e a administração funciona. A maioria dos restantes são exemplos pouco recomendáveis. Se houver interesse em combater a corrupção é inútil deixar essa luta nas mãos do Estado.

 

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