A ILUSÃO DE OBAMA
Obama vai levar a América para uma guerra que ele julga
rápida e localizada. Ou seja, partilha uma ilusão histórica que invariavelmente
acabou mal. Em 1914, a Alemanha apoiou a Áustria, o famoso "cheque em
branco", porque em parte (e só em parte) julgava que as coisas ficariam
por uma invasão da Sérvia. Em 1939, o próprio Hitler, já em guerra com a
Inglaterra e a França, pensava que uma e outra acabariam por não intervir
militarmente. Da Antiguidade até hoje esta espécie de optimismo cego e surdo
matou, como se sabe, dezenas de milhões de pessoas. Obama anunciou um ataque
punitivo contra a Síria, prometendo que ele não iria durar muito, que não poria
tropas no terreno e que nem sequer era dirigido a liquidar o regime de Assad. O
uso de gás contra civis (427 crianças) clamava por castigo. Sem mais.
Sucede que depressa se viu que Obama e o seu irresponsável
aliado, David Cameron, estavam isolados. Primeiro, estavam isolados
diplomaticamente. Excepto a França, nenhuma potência ocidental, grande ou
pequena, se queria envolver numa aventura tão ambígua e perigosa. Segundo,
tanto na América como em Inglaterra o grosso da opinião pública (60 por cento)
condenava um exercício de força, que, em princípio, deixaria Assad em Damasco
e, se a situação se complicasse, talvez degenerasse numa guerra, que tarde ou
cedo acabaria por se alargar ao Médio Oriente inteiro. Para não falar nos
bandos de milícias, nomeadamente no Hezbollah, que não tardariam a intensificar
o terrorismo no Ocidente.
Por isso, Cameron foi obrigado a pedir a confiança do
Parlamento, que a recusou; e Obama a do Congresso, que, pelos debates, não
parece muito entusiasmado. A maioria da Comissão de Estrangeiros do Senado
votou pelo Presidente por uma pequena margem (10-7) e depois de ter garantido
ao senador McCain um reforço substancial da ajuda aos rebeldes (que incluem a
Al-Qaeda). Na Câmara dos Representantes, mais próxima do cidadão comum, a
percentagem de "hesitantes" é altíssima (acima dos 70 por cento),
porque a populaça não esqueceu o Iraque, continua a suportar o Afeganistão e
não ignora que uma nova ingerência da América no Médio Oriente aumentará o ódio
universal ao autoproclamado "polícia do mundo", desta vez arvorado em
director de consciência. Por aqui, o Governo ainda não abriu a boca sobre o
assunto. É o melhor.
Vasco Pulido Valente - Público
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