quinta-feira, 21 de março de 2013

Os desabafos na rua




Sobre as últimas grandes manifestações contra as políticas daqueles que governam os portugueses. 

José Manuel Fernandes - Público

"Tal como paira sobre o país, pairou sobre as últimas manifestações uma sensação de fatalidade. Houve manifestantes que ingenuamente o confessaram, quando disseram aos repórteres que provavelmente nada mudaria no dia seguinte aos desfiles, mas houve sobretudo a enorme omissão sobre como fazer diferente. A própria convocatória criou o paradoxo: devia-se estar ali para dizer "que se lixe a troika", mas esteve-se ali sobretudo para desabafar contra os poderes públicos. Muitos, talvez a maioria, dos que desfilaram nem sequer querem que a troika se vá já embora - sabem que tudo ficaria pior se isso acontecesse. Mas a quase totalidade está zangada com o que nos está a acontecer e precisava de o dizer alto. Sobretudo os idosos da classe média, os que nos últimos dias de Fevereiro ficaram a conhecer os cortes nas suas pensões. Mas a sensação de fatalidade tem raízes mais fundas, não deriva apenas das emoções contraditórias de um dia de manifestações. Ela radica na falta de esperança e num sentimento difuso de desorientação. Falta de esperança não por causa do discurso canhestro do Governo, como gostam de explicar alguns comentadores e candidatos a conselheiros do príncipe, mas por se olhar para o país, para a Europa e para o mundo e não se perceber como é que as coisas vão poder melhorar. A revolta contra tudo o que é político, naturalmente com mais virulência contra tudo o que é ministro, mas também contra tudo o que é banqueiro, ou gestor, ou reformado rico, não corresponde à reemergência do velho mal nacional da inveja, antes deriva da percepção de que os futuros estão fechados, de que os elevadores sociais desapareceram, de que deixou de se saber o que fazer para melhorar a vida (...) Olha-se para isto tudo, olha-se também para o espectáculo dado nos últimos meses pelas nossas elites, presas como nunca aos seus preconceitos, às suas vaidades e aos seus privilégios relativos, e facilmente se entende a sombra que pareceu pairar sobre os manifestantes. É para as razões dessa sombra, para os porquês do sentimento de fatalidade que desceu as avenidas de braço dado com uma longa lista de indignações e queixas, que os responsáveis políticos deviam olhar." Ler mais.

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