"O contrato com Sócrates para ser comentador semanal no canal público de televisão teve de partir, ou de passar, por Relvas. Isso é óbvio. É uma contratação que infelizmente não surpreende porque, na verdade, José Sócrates e Miguel Relvas são políticos siameses. A história da licenciatura de Relvas foi o primeiro sinal de uma semelhança que se revela bem mais funda: o mesmo fascínio pelo mundo dos negócios, o mesmo desprezo pela cultura e pelo mérito, o mesmo tipo de relação com a comunicação social, o mesmo apego sem princípios ao poder e, acima de tudo, a mesma lata, uma gigantesca lata!
Como já há tempos afirmei, Sócrates e Relvas são sem dúvida
os dois políticos que mais contribuíram para a crise moral, e de confiança, que
o País atravessa. São casos que a radical mediatização dos nossos dias
facilita. Nomeadamente, porque ela abriu as portas à irrupção de um novo tipo de
político, que trocoua imagem de cidadão esforçado, reservado e responsável de
outros tempos, por um perfil em que o traço dominante é, simplesmente, o da
lata. E essa lata, é o quê? É sobretudo a expressão de uma
afirmação pessoal sem limites de qualquer ordem, que tudo arrasa no seu
caminho, num júbilo mais ou menos histérico.
Os "políticos de lata" estão em sintonia com
muitas transformações do mundo contemporâneo, e que é por isso que eles
suscitam inegáveis apoios e vivas controvérsias. Figuras maiores, bem
ilustrativas deste fenómeno, são Sílvio Berlusconi ou Nicolas Sarkozy. São sempre criaturas mitómanas, destituídas de superego e,
portanto, de sentido de culpa ou de responsabilidade. Revelam uma contumaz
incapacidade de lidar com a frustração, que é, como Freud bem ensinou, onde
começam todas as patologias verdadeiramente graves. Com eles, tudo se dissolve num narcisismo amoral, quase
delinquente, que vive entre a alucinação de todos os possíveis e a rejeição de
quaisquer limites.
A lata tornou-se num traço político muito frequente, que
anima os mais variados, e lamentáveis, tipos de voluntarismo. Não admira pois
que os políticos de lata se singularizem, não pela sua dedicação a causas ou a
convicções, mas pelos intermináveis casos em que se envolvem e são envolvidos. É também por isso que eles têm sempre que tentar voltar -
foi assim com Berlusconi, é o que se tem visto com Sarkozy, chegou a vez de
José Sócrates. Não resistem... e todos encenam, para disfarçar a sua doentia
obsessão com o poder, umas travessias do deserto mais ou menos culturais...
Berlusconi com a música, Sarkozy com a literatura e o teatro, Sócrates com a
filosofia. Mas o seu compulsivo "comeback" acaba sempre por
se impor, porque ele é o tributo que eles têm que pagar à sua tão vazia como
ilimitada mitomania.
O que Sócrates deve fazer é assumir as suas
responsabilidades na crise, e pedir desculpa aos portugueses - e para isso
bastava uma entrevista pontual, sóbria, esclarecedora e responsável. É isso que
os Portugueses merecem, é disso que a nossa democracia precisa, e é a isso que
o Partido Socialista tem direito. Ficar a pastar nos comentários, pelo
contrário, é puro circo político, e do pior: é usar o horário nobre do serviço
público de televisão para jogadas de baixa política e de pura revanche política
pessoal."
Manuel Maria Carrilho Ler mais
Fala quem sabe e bem conhece a criatura. E nada melhor que uma "narrativa" sobre as principais qualidades dos grandes "animais políticos" do nosso tempo. O bicho promete e a desforra também. Haja animação e bofetada se necessário.
Manuel Maria Carrilho Ler mais
Fala quem sabe e bem conhece a criatura. E nada melhor que uma "narrativa" sobre as principais qualidades dos grandes "animais políticos" do nosso tempo. O bicho promete e a desforra também. Haja animação e bofetada se necessário.
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